Não-Transitividade

O quadro ao lado representa bem o ciclo de dados que se considerou: em cada coluna estão indicados os números de pintas das seis faces e em cima a probabilidade de esse dado ganhar ao representado na coluna seguinte (a seguinte à última é a primeira).

Na situação atrás referida, se, realmente, o primeiro jogador tivesse escolhido o dado \(A\), bastaria ao segundo escolher \(D\), para ter uma probabilidade de 2 contra 1 de ganhar ao primeiro. Mas se o primeiro jogador tivesse escolhido qualquer outro dado, bastaria ao segundo escolher o precedente (na seriação \(A\), \(B\), \(C\), \(D\)) para ter uma probabilidade de 2 contra 1 de ganhar ao primeiro. Isto é, o jogador que escolhe o dado em segundo lugar é que parte em grande vantagem, pois pode sempre escolher um dado melhor do que o do outro jogador (a noção de cortesia é invertida neste contexto: ser cortês é aqui “servir-se primeiro” e não “deixar o adversário servir-se”...).

Conclusão: a pergunta inicial está mal formulada e induz uma ideia errada; antes de perguntar qual o dado melhor, seria prudente estar certo de que existe sempre um dado melhor do que todos os restantes (pelo menos num sentido lato). Ora isso não acontece, como o comprova o exemplo dado.

Na exposição “Matemática Viva”, havia uma mesa (ver foto da figura 1) e, sobre ela, quatro dados com a composição \(A\), \(B\), \(C\), \(D\) indicada acima. Com quatro jogadores à volta da mesa, cada um jogava um número razoável de vezes com o seu vizinho da direita e anotava o resultado, depois o da direita jogava com o seguinte (à direita) e assim sucessivamente. Com grande probabilidade2, cada jogador ganhava ao jogador à sua direita, o que acabava por “sugerir” que não havia nenhum dado melhor do que todos os outros3.


2 Suponhamos que, para cada par de jogadores, há um lançamento dos dois dados, não apenas uma vez, mas sim um número n (ímpar) de vezes. Se se considerar ganhador aquele que mais vezes obtiver um número maior do que o do oponente, então a probabilidade de \(A\) ganhar a \(B\) neste jogo aumenta relativamente à de \(A\) ganhar a \(B\) com apenas um lançamento de \(A\) e outro de \(B\) (suposta \(> 0.5\)). É esta a razão pela qual se preconizava no módulo da “Matemática Viva” que os visitantes repetissem várias vezes os lançamentos. O leitor pode verificar que essa probabilidade é dada pela seguinte fórmula:

\(\sum_{=k}^{n}\left(_{j}^{n}\right)p^{j}q^{n-j}\), em que \(n=2k-1\) e \(\left(_{j}^{n}\right)=\frac{n!}{(j!(n-j)!)}\).

Os primeiros vinte valores, para \(n = 1,3,...,39\) são aproximadamente: \(0.667\), \(0.741\), \(0.790\), \(0.827\), \(0.855\), \(0.878\), \(0.896\), \(0.912\), \(0.925\), \(0.935\), \(0.944\), \(0.952\), \(0.958\), \(0.964\), \(0.969\), \(0.973\), \(0.977\), \(0.980\), \(0.982\), \(0.984\).

3 Refira-se como curiosidade que, se \(B\) jogasse com \(D\), a probabilidade de lhe ganhar seria \(\frac{1}{2}\), e, se \(A\) jogasse com \(C\), a probabilidade de \(A\) ganhar seria \(\frac{4}{9}\).